Nasci em Luanda em 1980 e em ’81, por motivos vários os meus pais saíram do país e foram viver para Portugal, onde tinham laços fortes, família e amigos. Costumo dizer que eles aguentaram até à última… até onde puderam.
Cresci a ouvir muitas histórias sobre Angola, relembro sempre com saudade, as almoçaradas lá em casa com os amigos que vinham lá da ‘banda’. Todos os amigos angolanos dos meus pais são meus tios, todos os seus filhos são meus primos. Assim eram as relações na Angola dos meus pais; quentes, próximas e muito familiares.
Escrever sobre a independência de Angola é escrever também sobre sentimentos contraditórios de tantos “retornados”, de tantas pessoas que conheci e por quem tenho um profundo carinho.
Quando estava na faculdade, uma das formas de ganhar dinheiro para as minhas viagens nas férias, era obviamente a trabalhar. Fui durante vários anos monitora de colónias de férias para adultos. Durante 10 dias, ia para alguma parte de Portugal, com cerca de 50 pessoas e organizava diversas atividades e passeios.
Eram campos de férias dos serviços sociais da presidencia do conselho de ministros, todos os participantes eram ex-funcionários; na sua maioria ‘retornados’ das ex-colónias. Foi uma das experiências mais gratificantes que tive na vida até hoje, eram 10 dias de pura aprendizagem e divertimento.
Todos tinham idade para serem meus avós, todos com deliciosas histórias para contar, e a despreocupação própria de quem já viveu muito e já não quer saber o que o mundo vai pensar deles.
Quase todas estas pessoas tinham instrução universitária ou equivalente, uma vasta cultura, conhecimentos e muitos carimbos no passaporte… E o que também todos tinham em comum, era uma profunda tristeza por terem deixado “a sua terra”, as suas vidas.
Estas pessoas tinham nascido em Portugal, mas os seus filhos tinham nascido e crescido em Africa e lá tinham vivido a época mais feliz das suas vidas. Voltar para Portugal, perder tudo o que tinham construído foi o pior que lhes passou.
Em minha casa a história não era contada da mesma forma, mesmo que se admitisse que em Angola se vivia muito melhor que em Portugal na época das colónias; reconhecia-se a todo o momento que a colonização não tinha sido nem boa, nem justa; e a descolonização ainda pior.
Estas pessoas ‘retornadas’ que conheci nos meus anos de faculdade, sentiram-se emocionalmente afetados; perderam não só os seus bens, mas um estilo de vida; perdeu-se uma sociedade construída durante décadas. Por este motivo poucos tinham a capacidade de ver a gravidade do que me contavam; diziam-me que tiveram que vir embora porque os ‘africanos’ destruíram e ficaram com tudo…
E eu pensava… ‘mas se o tudo era do país deles, eles eram os nativos…’
Se o que veio depois da independência não foram boas escolhas, nem boas atitudes, pois seguramente que não! Uma guerra civil que matou tanta gente; e uma ditadura mascarada, que priva ainda hoje os cidadãos, entre outras coisas, de liberdade de expressão. Um país onde se passam semanas sem água nos canos ou luz em casa, onde o trânsito é caótico e o lixo acumula-se nas ruas. Esta não é a Angola dos “meus retornados”, nem a Angola dos meus pais.
Mas esta foi a situação que derivou de uma independência a que os angolanos tinham direito; assim como todos os povos que foram colonizados. Cada povo deve ser independente e deve ser livre para escolher e decidir o seu futuro.
Angola é ainda muito jovem e tem um longo caminho pela frente, cabe às novas gerações lutarem pelo seu país e elegerem os governantes corretos.
Parabéns à Independência, que seja usada para que nunca falte a igualdade e a justiça, num país com tanto futuro.
É sem dúvida um tema bastante polémico, mas viva Angola e a independência e que esse país que me dizem ser tão maravilhoso consiga libertar-se outra vez, erguer-se e caminhar sozinho.
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Cumprimentos patrióticos!
Viva Angola, viva os 4.0 da Dipanda!
Na generalidade concordo com o que escreves…Porém e para teres certeza ou incerteza de alguns temas que mencionas tens que vir a banda para ver,ouvir e sentir!
Aqui tudo se diz e tudo se faz….é a cada 4 anos a maioria elege os mesmos…quanto mais não seja pelo receio de que os que estão hoje na oposição possam governar ou desgoverna. ..Para a maioria é desgoverna. ..sentimento assumido! A maior e mais consistente oposição está dentro da maioria! É lá que também estão alguns dos mais críticos. Porém não queremos nada imposto pelos que estão fora do país. ..é nem tão pouco desejamos uma Líbia ou Síria!
Vais te admirar com os tablóides dos semanários, com os sites de informação e com a visão na maior parte das vezes tendenciosa da SIC e de algumas franjas da tuga!
Nós os Angolanos somos naturalmente orgulhosos de nós mesmos…mesmo quando não há motivos…a nossa história de “jogo de cintura” mostrou e mostra como devemos ser criativos! !
A Angola de hoje não é a do tempo do cólon e nem tão pouco a dos primeiros anos da dipanda. Em muitos aspectos melhorou, noutros nem por isso é noutros piorou….porém hoje ela é dos mwangoles, como todos os vícios, cunhas e imperfeições. ..
Viva a Dipanda!
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Sei que tens razão. Tens toda a razão! Mas eu só posso escrever sobre o que vejo cá de fora, e tento nao me deixar influenciar. No geral da democracia, se a oposiçao tambem nao serve para governar, entao há que esperar sangue novo e criar uma nova oposiçao. Mas está provado que tem q haver mudança. Os mesmos de sempre sentados nos mesmos lugares demasiado tempo, criam habitos viciosos a favor de eles mesmos. O tempo fa-los esquecer do porquê de estarem ali, do proposito inicial e de quem devem sevir.
Conheço os angolanos e também me orgulho do seu “jogo de cintura”, mas para quem ja viveu noutras partes do mundo e sabe que há outra forma de viver e de tudo funcionar melhor, deviamos sempre ambicionar menos vicios, menos cunhas e menos imperfeições. Mas estou de acordo contigo quando dizes que Angola é dos mwangoles, porque assim é que tem que ser. Abaixo o colono sempre, viva a independencia e viva a democracia!!
Tenho q ir aí! Soon!! 😘
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Sou mais velha que tu e já nasci em Portugal. Os meus pais e os meus avós fugiram debaixo de fogo cruzado e às escondidas na calada da noite para não serem recrutados à força para o exercito. Cresci com histórias de uma Angola vasta, de terra vermelha e de liberdades. Cresci com a amargura dos que fizeram vida em Angola, adoptaram-na como terra natal e não conheciam mais nada porque eram quinta ou sexta geração lá. Tenho sentimentos contraditórios sobre Angola e ainda que já tenha tido oportunidade de lá ir não me senti capaz porque não sei como reagiria. Entretanto fui a outros sítios com a mesma vastidão, terra vermelha e o cheiro a chuva e percebi que era lá que deveria estar. Como os retornados sou de Africa sem ter nascido em Africa.
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