Todos os países têm as suas tradições, muitas são conhecidas internacionalmente, outras nem tanto. Às vezes só quando se vive num determinado local e se convive com as pessoas da terra, é que se tem contacto com o que é realmente tradicional. Isso também nos ajuda a conhecer e a compreender um povo, os seus hábitos e costumes.
Hoje escrevo sobre os ‘calçots’, uma tradição catalã cuja temporada alta é neste preciso momento e que nós, todos os anos, fazemos questão de fazer. Em bom português pode parecer apenas uma cebola assada no fogareiro, mas na realidade é muito mais que isso.
De uma forma especial de cultivar a cebola (cebola tardia de Lérida), deriva o nome calçot, uma vez que se vai adicionando terra à base, para que a cebola tenha que se alargar ao subir em busca da luz. Este processo chama-se em catalão “calçar” e repete-se duas a três vezes durante o cultivo, até que se consiga que o talo branco fique suficientemente comprido (entre 15 a 25 centímetros).
A temporada de calçotes é entre Novembro e Abril, mas o seu auge é a partir do último domingo de Janeiro, momento em que se celebra a ‘Fiesta de la Calçotada’ em Valls – em Tarragona.
É sem dúvida um dos pratos típicos da cozinha catalã, e também uma das festas gastronómicas mais interessantes que conheço.
As calçotadas fazem-se nas ruas, nos bairros, entre grupos de amigos ou de vizinhos e sempre com muita alegria. É muito mais do que um almoço, é uma celebração cheia de detalhes.
A primeira vez que comi foi em 2008, em Colomers, na casa da minha querida amiga Magali. Uma catalã de coração, independentista convicta que contraria o estereótipo dos catalães, já que é uma das pessoas mais sociáveis e comunicativas que conheço e que adora misturar-se com diferentes culturas.
Numa Catalunha profunda, onde praticamente se fala apenas catalão, passámos um maravilhoso fim de semana de inverno, com a lareira acesa, calçotes e butifarra, um porrón sempre cheio de vinho, grandes amigos e boas conversas. Para mim, isto é que é uma boa calçotada!
Hoje em dia para comer calçotes continuamos a juntar-nos com amigos que vivem no campo e podem assar calçotes no quintal, ou às vezes a empresa onde trabalha o H. organiza um sábado e oferece uma grande calçotada a todos os trabalhadores.
Mas quase sempre comemos também os calçotes em restaurantes; vários têm menus de calçotada, e entre 25€ e 40€ recebe-se uma telha com 25 calçotes, pão com tomate, carne à brasa, vinho, sangria ou água, sobremesa e café.
A particularidade dos calçotes é que se cozinham com fogo alto, utilizando a cepa da videira para assar. Quando a primeira capa está completamente queimada, envolvem-se em papel de jornal, para acabar de cozer no seu próprio calor.
Têm um sabor ligeiramente adocicado e acompanham-se com um molho feito de tomate, amêndoas, azeite, pimento e avelãs (molho romesco).
Depois dos calçotes, serve-se normalmente uma parrilhada de carne e butifarras (a salsicha tipica catalã), com batatas assadas na brasa (al caliu), alcachofras e molho ali i oli (uma espécie de maionese de alho).
Comê-los é todo um ritual, com luvas e babete, queixo ao alto, de cima para baixo e muita risota pelo meio.
Recomendo a todos os que visitarem a Catalunha no início io da primavera, a procurarem um sítio para degustarem este prato e viverem a verdadeira experiência catalã.
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